A alegria dos outros

Tinha acabado o último cigarro e da tela já não tinha mais imagem pra ser vista.
A festa no vizinho era grande.
Sentei na poltrona da varanda, um estofado de dois lugares que encontrei ao lado do lixo.
Tocavam eletrobrega, funk melody.
Peguei a biografia de Clarice que tinha encontrado numa doação de livros.
O cheiro de churrasco invadia minha casa.
Primeiro Carnaval de Clarice. Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança.
Um estardalhar de vidro e gritos. Quebraram uma garrafa de cerveja.
A mãe de uma amiga resolveu fantasiar a filha de “rosa”. Como sobrou papel crepom, a mãe da meina fez também uma igual para Clarice.
O que pensa que eu sou? Se não sou o que pensou me libera, não insista. Vá viver um outro amor.
Quando estava vestida de papel crepom todo armado, ainda sem batom e ruge, minha mãe de súbito piorou muito de saúde. Mandaram-me comprar um remédio depressa. Fui correndo vestida de rosa entre serpentinas e gritos de carnaval. A alegria me espantava.
Sempre fui guerreira mas foi de primeira. Me vi indefesa. Coração perdeu a luta assim.
E como nas histórias que eu havia lido, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina.
A festa estava muito animada.

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